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A Líbia é um caso à parte na actual revolta do mundo árabe. Porque tem muito petróleo, porque tem um líder carismático e porque é constituída por uma sociedade tribal.
Todos estes elementos fazem que o desfecho das revoltas possa ser uma explosão em pequenos focos de guerra civil.
Um líder carismático.Apesar da suposta abertura do regime libiano, com destaque para a abertura nas relações internacionais, nada de fundamental mudou internamente. Do ponto de vista internacional, a Líbia diz ter oficialmente deixado de financiar o terrorismo internacional. Kadhafi já financiou toda a espécie de terrorismo: córsico, irlandês, filipino e até o sanguinário Abou Nidal.
Do ponto de vista interno, a vida dos seus 6 milhões de habitantes pouco se alterou, e quase metade da população vive perto do limiar de pobreza, apesar da riqueza proveniente do petróleo. Ainda assim, tem o mais alto PIB africano e a maior esperança de vida (cerca de 74 anos).
Em 1951, a Líbia foi o primeiro país africano a tornar-se independente. Mouammar Kadhafi chegou ao poder no dia 1 de setembro de 1069, nacionalizou os recursos económicos e desde de muito cedo governou a Líbia com um punho de ferro.
Os temíveis Comités Revolucionários.
Teoricamente a Líbia é uma "democracia directa" onde o poder é exercido pelo povo. Em cada localidade, as escolhas são debatidas e decididas por um congresso popular de base e a nível nacional as decisões são tomadas pelo congresso geral do povo. Do lado do executivo os comités populares gerais tomam as decisões. O Coronel Kadhafi não tem oficialmente qualquer papel político, a não ser o de "guia" que aconselha e inspira o povo.
A realidade é bem diferente, a chamada democracia directa é inteiramente controlada por Kadhafi e os seus terríveis Comités Revolucionários. Esta organização é um misto de partido político e de serviços secretos paralelos. Só elas estão autorizadas a ter uma estrutura política e são elas que em nome duma legislação baptizada de "lei para a protecção da revolução" prendem e matam qualquer opositor.
Meios de comunicação nas mãos de Kadhafi.Apesar de ter assinado o Pacto Internacional Relativo aos Direitos Civis e Políticos, não existe qualquer liberdade de expressão na Líbia. Os quatro jornais diários, Al-Jamahiriya, Al-Chams (« O Sol »), Al-Fajr al-Jadid (« A Nova Madrugada ») et Al-Zahf al-Akhdar (« A Marcha Verde ») e os jornais oficiais dos comités, são controlados pelo estado, assim como as televisões e rádios.
No entanto, o nome oficial da Líbia continua a ser a Grande Jamairia árabe Líbia Popular e Socialista:
الجماهيرية العربية الليبية الشعبية الإشتراكية العظمى
Sendo a tradução de "Jamairia" o de "Estado das massas", sob entendido do povo. Contudo esse povo não tem direito a expressar qualquer opinião contrária à de Kadhafi, até durante os Congressos Populares, deve ser evitada qualquer crítica ao "guia" sob pena de ser preso.
Kadhafi: o megalómano.
Em dezembro de 2007, durante o seu périplo a Lisboa, Madrid e Paris, Kadhafi terá gasto cerca de 25 mil milhões de dólares em despesas de viajem (350 pessoas em vários aviões dos quais 2 para transporte de veículos blindados), compra de aviões e armamento.
Kadhafi e a sua família, que ocupa os lugares chave na vida política do país, não hesitam em eliminar pura e simplesmente os eventuais opositores. Kadhafi já foi alvo de várias tentativas de atentados, das quais se destacam a de Anwar el-Sadate e a o famoso bombardeamento da sua residência comandada por Reagan com a participação de Margaret Thatcher.
Todo o dinheiro proveniente da venda do petróleo é gerido pelo coronel Kadhafi que o distribui a quem bem entende. Calcula-se que os lucros da venda do petróleo líbio terão sido desde 1970 de 1 milhão de milhões de dólares, ou seja o equivalente ao PIB de todo o continente africano de 2006.
Com a sua enorme produção de petróleo, seria esperar que o nível de vida da população tivesse melhorado bastante, mas quando comparado com a Malásia, outro país muçulmano sem grandes reservas naturais, vemos que enquanto o PIB da Malásia foi multiplicado por 7 nos últimos 20 anos, o da Líbia apenas duplicou nos últimos 30 anos.
As forças de que dispõe Kadhafi.Agora com estas revoltas do povo líbio, seguindo as pegadas dos vinhos árabes, fala-se em perto de 1000 mortos provocados pelos militares, por snipers e até por tiros de helicópteros. Dada a falta de informação, este número é difícil de confirmar, poucos são os media no local e muitas das comunicações telefónicas foram cortadas.
O regime de Kadhafi tem à sua disposição 60 000 homens de segurança e 30 000 milicianos dos Movimentos dos Comités Revolucionários. Mas o verdadeiro pilar do regime é a guarda pessoal composta por cerca de 22 000 soldados de elite, mais bem equipados do que a sua tropa e pertencendo quase todos à tribo do "guia", a tribo dos Kadhafa.
A grande incógnita é saber se as tropas regulares permanecerão fieis ao regime. Por enquanto tudo leva a crer que sim. De qualquer maneira Kadhafi ainda pode contar com os rebeldes tuaregue da Nigéria e do Mali que regularmente recebem treino militar no sul da Líbia, e eventualmente dos rebeldes do Darfur do Movimento para a Justiça e Igualdade. Pensa-se que também disponha de uma centena de mercenário.
Uma sociedade tribal.
A sociedade líbia é muito diferente da do Egipto: é uma sociedade tribal.
Kadhafi conseguiu controlar as tribos concedendo-lhe um papel social importante, mas foi sobretudo no seio das forças de segurança que o modelo das tribos se faz mais notar com generais militares de cada uma delas a dirigir os vários sectores.
A situação do país pode tornar explosiva dada esta organização tribal. Na região oriental do país, onde as manifestações de revolta se fazem mais sentir são as tribos mais influentes, dos Al-Zauya e dos Al Warfalla, que estão prestes a tomar o poder.
Esta zona oriental da Líbia faz fronteira com o Egipto, país onde as forças armadas continuam a deter o poder. Estas estão muito ligadas aos Estados Unidos, que queriam ver instalar-se na região um sistema que combinaria um islamismo político moderado e armado à semelhança da Turquia ou do Paquistão.
As tribos na Líbia têm actualmente um papel sobretudo social, e se é verdade que muitos chefes tribais aproveitaram inicialmente o sucesso económico do país, rapidamente este equilíbrio se deslocou para o clã Kadhafi, que pertence à tribo Kadhafa do centro do país.
Os líderes religiosos também nunca viram com bons olhos um país muçulmano reivindicar-se socialista e onde as mulheres têm um estatuto invejável para um país árabe, com igualdade de direitos e proibição da poligamia.
O mundo árabe tomou consciência que não está condenado a viver sob regimes arcaicos e totalitários, dirigidos por líderes da época da descolonização. É o fim da excepção árabe onde as populações cultas não tinham acesso à democracia.
http://www.jeuneafrique.com/jeune_afrique/article_jeune_afrique.asp?art_cle=LIN12026lavriemmohl0http://www.jeuneafrique.com/Article/ARCH-LIN16127deuxmruojra0.xml/
http://www.rfi.fr/afrique/20110222-libye-avenir-regime-kadhafi-question
http://socio13.wordpress.com/2011/02/24/la-lybie-quelques-donnees-importantes-par-danielle-bleitrach/
http://www.rfi.fr/afrique/20110223-mouammar-kadhafi-combien-divisions