sábado, 29 de dezembro de 2012

Morrer em silêncio











A velhice, outrora sinónimo de sabedoria, deixou de ter qualquer lugar na nossa sociedade actual baseada no "eternamente jovem". O velho foi relegado a lixo, desprezável e desprezível porque velho. Abandonados pela sociedade e pelos próximos, que nada têm a aprender com eles, dado que o neto e até o próprio filho "sabem" mais do que ele, ficam relegados ao isolamento.




A situação em Portugal


Hoje, temos mais de 19% da população com mais de 65 anos de idade, e mais de  40 000 idosos não têm capacidade financeira para comprar alimentos.


Cerca de 38% dos idosos portugueses vivem com a família, mas cada vez mais são abandonados em hospitais nos momentos de férias, por incomodarem, porque são um fardo, e assim ficam afastados, escondidos, entregues às instituições.


Só no ano passado, a PSP registou cerca de 3 000 casos de idosos encontrados mortos em casa, abandonados, sem que ninguém se preocupa-se com as suas vidas. Na "operação Censos Sénior", a GNR identificou 23 000 casos de idosos a viverem isolados.


Os idosos, além do isolamento, têm problemas dentários (35%), dificuldades económicas (24%), falta de apetite (13%) e falta de medicamentos (12%). 40 000 idosos deixarem de poder comprar o passe de 3ª idade, com 50% de desconto, por falta de dinheiro, esse facto, de não se poderem deslocar a um preço acessível, isolou-os ainda mais.



Os países "atrasados" dão o exemplo.


Claro que nas nossas sociedades ocidentais, qualquer miúdo de 12 ou 14 anos "sabe" mais que qualquer avô, basta irem à internet, têm lá tudo, excepto a vivência, fruto da sabedoria ancestral. Em África ou em certos países asiáticos, os mais velhos são guardiões da herança colectiva. A idade tornou-os uma realidade sócio-cultural, têm um papel social específico, têm uma grande importância sobre o mundo que os rodeia e interagem com esse mundo.


As nossas comunidades ocidentais desprezam os idosos, não têm um lugar na nossa sociedade, incomodam, são feios, enrugados, são um fardo, não fazem parte integrante dessa comunidade. Com a sociedade de consumo, de imediatismo, do "eternamente jovem", as sociedades ocidentais perderam essa mais-valia: o valor do núcleo familiar e a mais valia dos mais velhos como parte integrante desse núcleo.



Velhice não é sinónimo de decadência.


A idade não é sinónimo de decadência, pobreza e doença. Esse conceito recente, só se encontra nas nossas sociedades ocidentais. A sociedade de prazer imediato não deve desprezar valores como o envelhecimento, cada vez mais prolongado pelos avanços tecnológicos que não acompanharam os valores humanísticos. O envelhecimento representa apenas mais uma etapa da vida que pode ser propício à realização e satisfação pessoal.


Os idosos podem e devem ser "fonte de recursos", seres activos capazes de oferecer respostas criativas às mudanças sociais, fazendo parte da relação familiar muitas vezes esquecida. Os idosos não se podem sentir competidores sexuais em relação aos mais novos, podem e devem ter direito a uma vida sexual plena, mesmo que vivida de uma maneira diferente.


Actualmente os idosos são vistos como improdutivo e portanto descartáveis, "apanhados" pelo tempo,  pela decadência física e mental, mas enquadrados numa vida familiar saudável podem manter, e devem manter, um lugar fundamental na nossa sociedade.


Claro que o envelhecimento trás um aumento da gordura corporal, perda da musculatura, diminuição da capacidade regenerativa dos vários orgãos, diminuição do débito cardíaco, diminuição da capacidade pulmonar ou diminuição do número de neurónios.


Mas os idosos podem melhorar esse declínio com o exercício físico moderado, diminuir o declínio psicológico com a interacção com os outros, e sobretudo serem integrados de pleno direito na vida familiar em que estejam integrados, vivendo uma vida útil nessa mesmo família, sem usurpar funções, mas tendo um lugar digno que compete a todos nós manter.


 


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16 comentários:

  1. Fizeste-me lembrar que vou sendo velho
    O Tempo passa
    Vamos o ver o que me toca
    Pela porta

    Saúde, é o nível mínimo de serviço
    Da felicidade desejada

    Que sejam cumpridos os teus mínimos
    Não é uma sentença é um desejo (sem gracejo)

    Bom Ano, meu amigo

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    1. Rogério,

      O tempo passa e vai continuar a passar mesmo sem nós, essa é que é a verdade, não somos nada e isso deveria-nos fazer pensar na nossa insignificância.

      Um bom ano para ti e tua família.

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  2. Poema do Idoso

    Se meu andar é hesitante
    e minhas mãos trêmulas, ampare-me.
    Se minha audição não é boa, e tenho de me
    esforçar para ouvir o que você
    está dizendo, procure entender-me.
    Se minha visão é imperfeita
    e o meu entendimento escasso,
    ajude-me com paciência.
    Se minha mão treme e derrubo comida
    na mesa ou no chão, por favor,
    não se irrite, tentei fazer o que pude.
    Se você me encontrar na rua,
    não faça de conta que não me viu.
    Pare para conversar comigo. Sinto-me só.
    Se você, na sua sensibilidade,
    me ver triste e só,
    simplesmente partilhe comigo um sorriso e seja solidário.
    Se lhe contei pela terceira vez a mesma história num
    só dia, não me repreenda, simplesmente ouça-me.
    Se me comporto como criança, cerque-me de carinho.
    Se estou doente e sendo um peso, não me abandone.
    Se estou com medo da morte e tento negá-la,
    por favor, ajude-me na preparação para o adeus.



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  3. A idade traz sabedoria - tanta mais quanto maior for essa mesma idade (e maiores forem as consequentes experiência de vida e acumulação de reflexões).

    Eu, que estou agora já em plena idade adulta (a meio dos meus 30s) noto bem o quão valiosa pode ser esta qualidade ou faculdade...

    Com a sabedoria vem o controlo, vem a precaução. Vêm as boas e as sensatas decisões. Vem a segurança. Vem a paz de espírito, muito importante - e consequente de tudo isto.


    Mas é indiferente a "utilidade" que possa ter, ou não, uma pessoa com muito idade (no que pode transmitir aos outros).

    Há excepção de quem não teve filhos, ou de quem os teve e os tratou mal, cuidar de um pai, ou de um avô, é algo que deveria ser inquestionável.

    E constatar que isto assim não o é para muita gente é - tal como diz no artigo - uma boa prova do estado de decadência, a todos os níveis, a que chegou toda esta sociedade.

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    1. Meu querido amigo,

      Numa coisa não podemos estar mais de acordo: a decadência da nossa sociedade relegou os mais velhos ao esquecimento, mas como dizes cuidar dos país, por exemplo, é um dever que deveria ser óbvio.

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  4. "Cautela" é uma outra coisa muito importante, que se vai adquirindo com a idade e a consequente sabedoria. Muito importante mesmo, quando toca a fazer decisões importantes que irão afectar o resto das nossas vidas. E algo que, por norma, não temos quando somos mais novos, por mais inteligentes que sejamos... ;)

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  5. Meu querido amigo Octopus

    Feliz ano novo para você e sua família, que em 2013 possamos continuar aqui nessa luta pela conscientização e que todos possam ter uma vida digna.

    Um grande abraço meu amigo

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    1. Burgos,

      Muita vez cansado de lutar para nada, mas nunca desistir. Um bom ano para ti também.

      Pode parecer corriqueiro, mas um abraço verdadeiro para ti.

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  6. Caro Octopus.
    O que pretendo colocar não muda nada a ondição dos atuais anciões, entretanto pode fazer a diferença para os futuros anciões.
    NO mundo animal, os anciões via de regra não existem (talvez só os topos de cadeia, mas mesmo assim em época de carestia, nem eles), pois são "equipamentos" que já fizeram suas partes. Logo são despensáveis.
    Nas sociedades humanas onde a tradição oral é fundamental, os velhos são as "bibliotecas" da sociedade e assim são respeitados, idolatrados até. São fundamentais para a mantenencia do tecido social.
    Entretanto em uma sociedade onde a linguagem escrita é a regra, o velho já aposentado é peso morto, e o pior, prejudicial ao meio, visto que além de serem sustentados pela sociedade (aposentadoria), ainda demandam uma enormidade de recursos e "atravancam o trânsito" do ritmo lépido das cidades.

    Entendendo essas variantes fica evidente que o que gera a depreciação do velho é a sua conduta senil e prejudicial (quando estamos "podres" temos que ter um mínimo de dignidade para sairmos de cena, tal e qual um elefante indo para o tal cemitério de elefantes). Para que isso não ocorra, temos que preservar o equipamento, temos que preservar os "pneus" e temos que poupar combustível, mas sempre andando muito forte para que não sejamos atropelados.
    Se o personagem passa a vida na esbórnia, só pensa no lúdico, é preguiçoso, sedent´[ario, ele VAI PAGAR, queira ou não queira, portanto acho que antes de sentirmos pena dos velhonhos temos que nos perguntar se eles sentiram pena deles próprios quando estavam destruindo suas saudes em busca de mais emoção.

    Não valem nossas intensões, valem nosssos atos!!!

    Um grande abraço e agradeço pelo material que vens proporcionando. Pensar indubitavelmente é uma qualidade cefalopodeana!! :-D

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    1. Tem toda razão no que escreve, e como sempre fez-me pensar.

      É verdade que do ponto de vista "animalesco" e evolutivo a maioria dos animais abandonam os seres mais fracos. Um animal doente torna-se assim presa fácil para os predadores, só sobrevivem os mais saudáveis e aptos. Porque é disso que se trata: a adaptação.

      Mas os humanos têm uma característica muito especial, e é disso que advém o meu optimismo, no meio disto tudo, ajudam os mais fracos. Não é caso único no meio animal, veja-se por exemplo uma cria de uma loba que morre, a matilha tenta ajudar e uma loba que o possa alimentar.

      Nós vivemos socialmente em manadas e aqui também os doentes, os inválidos e os velhos também são ajudados. É isso que nos faz tão especiais, não abandonamos, ou não deveríamos abandonar os mais fracos em nome de uma certa coesão social.

      Esse dever moral torna-nos diferentes e torna a nossa espécie mais bela. Neste caso, o mais velho é o detentor de sabedoria, por muita tecnologia que haja, é insubstituível.

      Relegar os mais velhos a simples objectos descartáveis é relegá-los ao esquecimento e a História é fundamental no progresso da humanidade.

      Um abraço

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  7. Olá...

    Este é apenas um dos muitos resultados de existirmos numa Civilização que preza mais os Interesses, que os Valores!

    DINHEIRO é o DEUS!
    TEMPO são os ANJOS!

    Os Velhos... São apenas algo que impedem os novos de ter TEMPO para obter DINHEIRO!

    Continuaremos assim por boas décadas... Tudo porque a MANADA não sabe que é ESCRAVA do SISTEMA MONETÁRIO, o Universo onde o Deus e os Anjos existem para serem idolatrados pelos animais humanos!

    Abraço

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    1. Sabes Voz,

      Sempre fui um inconformado, na minha juventude muito mais lutador. Com a idade, moderei mais as minhas opiniões, mas existem certos valores que sempre defenderei. O respeito e carinho para os mais velhos são uma obrigação nossa. O valor do núcleo familiar, com o risco de parecer antiquado, é outro desses valores. A igualdade do sexo feminino é outro desses valores. O respeito pelos outros, mesmo que de opinião contrária, é outro. Sempre tenho defendido esse valores nos meus artigos, porque na nossa ânsia de consumismo, são valores esquecidos.

      Um abraço amigo

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  8. Verdade seja dita: há muito velho que não se dá ao respeito.

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  9. Hoje Eles amanhã Nós. Porque não semeamos hoje para colher amanhã?

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  10. Caro Antônio Santos,
    Por que não semearam eles ontem para que colhessem algo melhor do que está, hoje?
    Essa é a questão hoje e será essa a questão amanhã, todos preferem deixar para "os descendentes" as responsabilidades de cortar na carne!!
    Existe um abismo entre velhice e decrepitude e senilidade, ambas as últimas são oriundas do desrespeito do ser humano com ele próprio. Coisa de epicuristas...
    Aprovo o respeito ao velho pelo jovem, mas aprovo mais ainda o respeito do velho por ele mesmo e pelos jovens, pois entendendo que da forma que ele, velho, deixou a coisa para o jovem, a última coisa que ele merece é respeito!!

    E respeitar a si é aceitar que se não garantimos algo de decente para nossos descendentes e todos os outros, não podemos ter tais descencias tão pouco.
    O problema é conjuntural e retirar qualquer classe social da linha de tiro é dar privilégios ao qual ninguém merece, se merecessem as coisas não estariam como estão.

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