quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A praxe é um nojo

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A praxe é um nojo, toda ela, das suas formas mais violentas às aparentemente inofensivas. Os esforços que alguns dirigentes estudantis, e infelizmente também alguns reitores e presidentes de conselhos directivos, têm feito para distinguir as praxes "boas" das praxes "más" são tão ridículos quanto vagos e abstractos. 


Nenhum arriscou dizer expressamente o que é aceitável e o que não é. Sabe que assim evita o debate e com sorte o tempo passa, o assunto sai da agenda mediática e tudo voltará à barbárie do costume. 


Toda a praxe assume e aceita uma hierarquia sem justificação e que não cumpre qualquer função, é feita em nome dos estudantes do primeiro ano porque promete a integração mas apenas serve para satisfazer os instintos mais primários e animais dos estudantes mais velhos.


Numa sociedade saudável ninguém precisa de ser maltratado para se integrar ou de ser submisso para ser aceite; fosse realmente a integração o objectivo dos estudantes mais velhos e as actividades a realizar seriam a negação da humilhação e da desigualdade entre alunos.


As praxes apelam ao pior do ser humano, quando a recepção ao novo aluno, pela primeira vez longe da sua terra natal e num ambiente desconhecido, exigiria as melhores competências e qualidades sociais dos estudantes mais velhos. Temos todos - estudantes, professores, pais, políticos e comunidade em geral - sido demasiado tolerantes e complacentes com estas práticas.


Uma sociedade decente não convive pacificamente com os espectáculos degradantes a que assistimos dentro das universidades mas também no espaço público. Uma sociedade decente combate activamente a humilhação, o exercício do poder pelo poder, a hierarquia injustificada e a violência - seja ela física, seja verbal ou psicológica.




Texto de Pedro Nuno Santos

Escreve à quarta-feirano jornal i
Publicado dia 29 janeiro 2014



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Praxes

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Se há algo que demonstra a degradação em que tem caído a nossa sociedade é a proliferação de praxes académicas, a pretexto de uma tradição que não tem qualquer cabimento, especialmente em universidades que surgiram no século xx


Na verdade, as praxes académicas, pretendendo ser rituais iniciáticos, são efectivamente exercícios de sadismo e de humilhação, que nunca deveriam ter lugar num Estado de direito. Invocando uma tradição académica inexistente, praticam-se a coberto das praxes verdadeiras violações dos direitos humanos, por vezes com consequências trágicas para os estudantes envolvidos. 


O que mais choca nas praxes é a total complacência das autoridades académicas e dos responsáveis políticos, que têm transigido com essas práticas em lugar de as reprimir severamente. Não é aceitável que os claustros universitários, em lugar de serem destinados ao ensino e à investigação, sejam utilizados como coliseus onde se praticam verdadeiros massacres de estudantes.


E muito menos é aceitável que as universidades, em lugar de acautelarem a segurança física dos seus alunos, aceitem pacificamente que os mesmos sejam submetidos a práticas de risco para a saúde e a própria vida. 


Em 1727, D. João V determinou que "todo e qualquer estudante que por obra ou palavra ofender a outro com o pretexto de novato, ainda que seja levemente, lhe sejam riscados os cursos". Sigam o exemplo do Magnânimo e decretem desde já medida semelhante. Vão ver como estes abusos acabam num instante. 




Texto de Luís Menezes Leitão

Professor da Faculdade de Direito de Lisboa. Escreve à terça-feira
Publicado no jornal i dia 28 janeiro 2014


sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

A obsessão do déficit público abaixo dos 3%

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O deficit público ocorre quando o valor das despesas de um governo é maior que as suas receitas, sendo este valor expresso em percentagem sobre o PIB de um país.




A famosa meta dos 3%.


Por disciplina financeira, os países membros do euro definiram que o deficit público de cada país não deveria ultrapassar os 3% do PIB.


O limite de 3% de deficit público, fixado pelo Pacto de estabilidade, tornou-se uma verdadeira obsessão para os burocratas de Bruxelas. Na realidade, mesmo em período de crescimento económico, a não ser dois ou três pequenos países da UE, a grande maioria nunca respeitou esse valor.


Este fetischismo das contas públicas levou à instalação de planos de austeridade que conduziram à destruição económica de vários países através de medidas de contenção de salários, aumento de impostos e venda ao desbarato do aparelho produtivo.


Prisioneiros do euro, e perante o imobilismo do BCE, os países do sul da Europa não têm qualquer meio de escapar à destruição da sua economia, tudo em nome do sacro-santo deficit público imposto, que os países do norte da Europa não respeitam.




Deficit público um instrumento capitalista.


A possibilidade de poder fazer variar o deficit público é instrumento económico que permite limar os vários parâmetros conjunturais. A proibição dessa possibilidade, com o limite dos 3%, advém de uma concepção ultra-liberal baseada na capacidade do mercado se auto-equilibrar e estabilizar a economia.


Esta obsessão da limitação do deficit público tem como finalidade escondida o aproveitar as crises para a restructuração do capital à custa dos trabalhadores.


Assim, numa sociedade capitalista, se o investimento público se destinar a coisas úteis, o deficit não é um drama, antes pelo contrário. Um deficit público mais elevado pode funcionar por parte do Estado como um motor de arranque económico, a meta arbitrária dos 3% não faz qualquer sentido. O Reino Unido tem vivido normalmente com valores mais elevados, 8,3% em 2011 e 6,3% em 2012.




Uma dívida impagável.


Não esquecer que o torna actualmente as dívidas públicas insustentáveis na zona euro têm em grande medida origem no artigo 123 do Tratado de Lisboa, que proíbe o financiamento dos Estados directamente com o BCE. Os bancos comerciais europeus financiam-se no BCE com uma taxa de 1%, para a seguir emprestar aos Estados o dinheiro a taxas que podem atingir os 11% !


É urgente rever os tratados europeus para permitir que os Estados se financiem directamente no BCE.


Desde a primavera de 2010 que a crise da dívida pública se tornou um pretexto para promover medidas de austeridade na Europa. A dívida é antes de mais um assunto de classe, trata-se de uma "redistribuição ao contrário" em que os rendimentos da maioria da população se desloca para os mais ricos.


O rendimento do trabalho tem baixado ao mesmo ritmo que tem aumentado o rendimento do capital.





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quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Os 85 mais ricos do mundo têm tanto como metade da população mundial mais pobre.

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Um relatório da ONG britânica Oxfam, divulgado nesta segunda-feira, mostra que o património das 85 pessoas mais ricas do mundo equivale às posses de metade da população mundial.










Ricos cada vez mais ricos e pobres cada vez mais pobres.


As 85 pessoas mais ricas do mundo têm um património de US$ 1,7 trilhão, o que equivale ao património de 3,5 bilhões de pessoas, as mais pobres do mundo. A Oxfam observou no seu relatório que, nos últimos 25 anos, a riqueza ficou cada vez mais concentrada nas mãos de poucos.


A renda líquida obtida em 2012 pelas 100 pessoas mais ricas do mundo, 240 bilhões de dólares, poderia acabar quatro vezes com a extrema pobreza no planeta. 


"É chocante que no século XXI metade da população do mundo não tenham mais do que a minúscula elite cujos números podem caber confortavelmente num autocarro de dois andares", afirmou Winnie Byanyima, diretora-executiva da Oxfam. 


Hoje, as diferenças entre os países estão diminuindo, mas a desigualdade entre os mais ricos e os mais pobres dentro de cada nação está crescendo.








A planeada desrugulamentação do sistema financeiro.


Globalmente, o que se passa é que os indivíduos e as companhias mais ricos escondem trilhões de dólares dos impostos na enorme rede de paraísos fiscais espalhados pelo mundo, estima-se que US$ 21 trilhões estão assim "escondidos" sem registros.


Não é uma coincidência o aumento da desigualdade no mundo desenvolvido desde os anos 1980. Foi nesta época que começaram a ter efeito as políticas lideradas pelos governos de Ronald Reagan nos Estados Unidos (1981-1989) e Margaret Thatcher (1979-1990) no Reino Unido, e adopatadas em boa parte por outros governantes, como Helmut Kohl (Alemanha), Ruud Lubbers (Holanda) e Bob Hawke (Austrália): impostos mais baixos, desregulamentação do sistema financeiro, redução do papel do governo e outras medidas integrantes do receituário neoliberal. 


Essa política, sustentada pela globalização, teve alguns efeitos positivos, mas foi levada ao extremos por quem se beneficia delas. Para manter as políticas desejadas, que aumentavam a sua riqueza (e também a desigualdade) esses grupos de interesse encrustaram-se nos círculos de poder. Eles sequestraram a política.
 

O resultado disso, seja nos Estados Unidos, na Europa, na Índia ou no Brasil, é uma grave crise de representação. O cidadão não consegue participar da vida pública e ter seus anseios ouvidos pelo governantes. Os partidos, à esquerda e à direita, caminham cada vez mais para o centro e, como diz o filósofo esloveno Slavoj Zizek, fica cada vez mais difícil diferenciá-los. A esquerda, supostamente contrária aos absurdos do liberalismo económico, ou aderiu a ele e também tem suas campanhas financiadas por grandes corporações ou não tem um modelo alternativo e crível a apresentar.








A política de austeridade factor de pobreza.


À escala da Europa, se a política de austeridade for mantida pelos dirigentes políticos actuais, há o risco de 25 milhões de europeus caírem numa situação de pobreza até 2025. No seu documento, a organização entende que o modelo europeu "está diretamente colocado em questão por políticas de austeridade mal concebidas".


A directora do ramo europeu da Oxfam, Natalia Alonso, criticou o recuo dos direitos sociais, "os cortes radicais nos orçamentos da segurança social, da saúde e da educação, a redução dos direitos dos trabalhadores e uma fiscalidade injusta", ingredientes desde há três anos das purgas económicas destinadas alegadamente a recuperar as finanças públicas na Europa.


O resultado desta política de austeridade terá como resultado a longo prazo a que um quarto da população se encontrem ameaçadas pela pobreza, incluindo a população activa com trabalho.
 

Os países sujeitos ao regime de austeridade, como os casos de Portugal e da Grécia, em troca de uma assistência financeira da UE e do Fundo Monetário Internacional, mas também a Espanha e o Reino Unido, "situar-se-ão em breve entre os países mais desiguais do mundo", se prosseguirem as suas políticas.


Esta ONG apela "aos Estados membros da UE para que defendam um novo modelo económico e social", assente numa fiscalidade justa e em investimentos públicos nos serviços e na inovação.


Sobre Portugal é ainda dito que entre 2010 e 2011 a desigualdade nos rendimentos tem beneficiado as “elites económicas”, dando-se como exemplo o crescimento do mercado de bens de luxo, e é dito que após as crises financeiras em geral os mais ricos vêem os seus rendimentos crescer 10% enquanto os mais pobres os perdem na mesma proporção.







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terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Governo português subsidia casinos !

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As contas da "Estoril Sol" (Casinos do Estoril, de Lisboa-Expo e da Póvoa de Varzim) respeitantes a 30/Set/2013 foram publicadas no sítio web da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM). 



Como pouca gente vê esse sítio e como os media "de referência" não as divulgaram, tais contas são praticamente desconhecidas do público. 


Verifica-se ali que: 

1) A empresa fechou o 3º trimestre com lucros de 1.258.281 €; 

2) As receitas diminuíram 5% em relação às da mesma data de 2012.


E, numa análise mais fina, constata-se que caíram 7% as receitas das slot machines mas subiram 2% aquelas do jogo bancado (bacará, gamão, etc).


No total de 137.771.294€ de receitas contabilizadas, 42% respeitam ao Casino de Lisboa-Expo, 37% ao do Estoril e 21% ao da Póvoa. 


Por sua vez, os benefícios fiscais recebidos ascenderam a 2.736.516 €, ou seja, 2% do total das receitas e mais do dobro do lucro registado!


Os referidos benefícios foram atribuídos como apoio do Estado à "renovação de equipamentos" (2.331.516€) e à "animação realizada" (405.000€). 



Aqui, mais uma vez, se vê o despudor deste governo. No momento em que corta em pensões de poucas centenas de euros de viúvas e viúvos, assim como nas remunerações dos funcionários públicos, concede benefícios de milhões para a renovação de slot machines e de espectáculos nos casinos!




Publicado por: http://resistir.info/